Terça-feira 31 de março fui dormir cedo embalado no som amigo do janelaço. Fui dormir pensando nos companheiros que se incorporaram a essa disritmia coletiva com a clara consciência que não era só uma manifestação contra os pusilânimes que nos governam, mas também, contra a política de esquecimento que tenta ser hegemônica no mundo contemporâneo.
Fui dormir pensando na necessidade e importância de recuperar a memória das atrocidades cometidas, em nome do mercado e do capital, no breve século XX, como diria Hobsbawn.
Recuperar a memória para que não se repitam essas atrocidades. Esse discurso tem hoje um sentido maior do que teve quando formulado. E tem, por que vemos aqui e acolá, tentativas e claros esforços dos neo fascistas contemporâneos para retomar essas práticas.
O discurso do general que ocupa a vice presidência – quem, como todos sabemos, não é confiável – deixo claro a vontade de voltar aos tempos da escuridão modernizadora que se implantou em 1964 abrindo caminho e, dando o péssimo exemplo, para que outras experiências autoritárias se organizassem na no cone sul da américa latina.
Pois bem, fui dormir cedo. Quando estava começando a cochilar, entre 23:30 e meia noite talvez, ouvi, entrando pela janela, uma gritaria ensurdecedora. Ouvi fora! Saiu! Foi embora! Salve, salve…e coisas similares.
Saltei da cama sobressaltado, corri para a sala a procura do controle remoto que é, desde o início da quarentena, minha ligação com o mundo exterior. Enquanto tateava no escuro os botões do aparelho, a imagem do cramulhão caindo se formava na minha cabeça.
Entre incrédulo e esperançoso consegui apertar o número da emissora hegemônica e a imagem que se apresentou na minha frente era, percebi logo, o da expulsão de alguém na casa de BBB BIG BOSTA BRAZIL. Demorei observando essas imagens não mais que trinta segundos, tenho mais o que fazer. Soube por aí que é programa campeão de audiência. Aliás, complemento, fui agora no Deus Google e vi que o paredão teve 1 bilhão de votos. Acho que isso explica muita coisa deste Brasil pouco varonil.
Confesso que a enorme decepção não foi capaz de me tirar o sono. Dormi e esqueci da história até a manhã de hoje. Não tenho como não pensar no paradoxo da situação. O sujeito ficou confinado, em segurança, sei lá quanto tempo e agora, por decisão popular, vai para outro confinamento que poderá ser pior que o anterior. Que azar!
Lembrei que uma ex-aluna chegou um dia radiante em sala de aula informando que que tinha feito mais de 150 ligações para o BBB. Não lembro se foram para salvar ou condenar alguém. Lá se foi o salário minguado da menina e, também, minha tranquilidade, pois voltamos a nos encontrar no semestre seguinte. Ninguém merece!

Sempre pior que a ficção Mariel. Abraços
CurtirCurtir